quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Patrimônio Histórico; Como Evitar Catástrofes




(Foto: Reprodução)


     A importância do Projeto de Segurança Contra Incêndio e Pânico no Brasil é estimável, em sua competência estão relacionados aspectos relativos à prevenção e combate contra o fogo, sendo que para elaborá-lo, deve-se atender uma série de normas técnicas a nível federal que é o caso das ABNT NBR e os IT’s (Instruções Técnicas) legais vigentes em cada estado, uma vez que os mesmos são fiscalizados, comentados e aprovados pelos respectivos Corpos de Bombeiros de cada estados.
     
     Tratando-se da elaboração desta categoria de projeto, também são levadas em considerações as antigas edificações que fazem parte do rico patrimônio histórico brasileiro, como era pra ter sido o caso do Museu Nacional gerido pela UFRJ na cidade do Rio de Janeiro, que iniciou o mês de setembro de 2018 consumido pelas chamas. Além da destruição do prédio, o local abrigava um Museu Natural que continham as mais diversas relíquias e obras de arte, além do acervo e documentos da família real, antigos moradores do palácio.

(Foto: OGlobo)

   A causa do Incêndio não foi diagnosticada até então, mas os noticiários relatam que à aproximadamente um mês, foi realizada uma denúncia junto ao Ministério Público Federal (MPF), onde um Arquiteto relatava as precárias instalações elétricas prediais e alertava para a possibilidade de um incêndio.

(Foto: Reprodução)

Através do noticiado no dia 04/09/2018 pelo G1 e das denuncias feitas contra a administração do Museu, vamos comentar e indicar uma sucessão de erros que possivelmente podem ter acarretado na destruição de um patrimônio da humanidade:


INSTALAÇÕES ELÉTRICAS

    A causa de incêndio mais comum no Brasil é iniciada por apenas um curto circuito, gerado pelas más condições das instalações elétricas, esses cabos também quando mal dimensionados pelos projetistas ou em muitos casos nem projetados, podem superaquecer e elevar os combustíveis ao redor até o seu ponto de fulgor que sob a irradiação pode iniciar uma chama.
   Os fios estavam à mostra e em péssimas condições de uso, muitas paredes eram revestidas por tecidos e a quantidade de madeira no palácio era incalculável, combustíveis sólidos, com alto teor inflamável.


EDIFÍCIO NÃO ASSEGURADO

     Você deve estar se perguntando o porquê deste tópico, não é mesmo? Pois bem. Assim como o carro, ao assegurar um bem, o mesmo é vistoriado para saber das suas condições; com os edifícios, indústrias, comércios, entre outros, é a mesma coisa, entretanto, a seguradora geralmente só se dispõe a proteger o local uma vez que o mesmo é aprovado em sua vistoria, visto que é um prédio de importância mundial e um patrimônio histórico, geralmente as seguradoras neste caso são internacionais e com isso, as Normas Técnicas de Proteção e Combate e Incêndio também. Sendo assim, mesmo com o Projeto aprovado no Corpo de Bombeiros e licença em mãos, ainda é muito baixo o nível de proteção. As normas mais importantes desta área são:
  • NFPA 909 – Standard for the protection of cultural resources.
  • NFPA 914 – Fire safety requirements for the protection of historic structures and for those who operate, use or visit them.
  • NFPA 2001 – Standard on clean agent fire extinguishing systems.

SITUAÇÃO IRREGULAR DO PRÉDIO

   O edifício também não estava regularizado e com o seu alvará de funcionamento licenciado, isso mostra que o mesmo não atendia aos aspectos mínimos de segurança, oferecendo um grande risco aos funcionários, visitantes e ao acervo. Permanecer com o edifício aberto ao público foi de uma grande irresponsabilidade da UFRJ, liderada pelo então reitor Roberto Leher e pelo diretor do museu, Alexander Kellner.
   

(Foto: OGlobo)

“Um incêndio dessa escala, e a realidade infelizmente demonstrou isso, precisava de intervenções sistêmicas.” – Roberto Leher 
   Não podemos tratar como sorte, mas por grande ventura, o incêndio aconteceu na madrugada de um domingo, havendo apenas alguns vigilantes do local que não se feriram.


CERTIFICADO DE APROVAÇÃO ATUALIZADO (ARQUITETURA)

    Este documento licencia o bom estado das estruturas e instalações do local. Neste laudo, a arquitetura é avaliada como um controle de acabamentos e o emprego de materiais inflamáveis no edifício. Este museu não havia conquistado tal Certificado de Aprovação dos Bombeiros. Nem mesmo o edifício em seu projeto de arquitetura estava de acordo com as normas, quem diria então, o atendimento aos requisitos técnicos de incêndio. Num total descaso pelo patrimônio e segurança dos usuários.


MATERIAIS INFLAMÁVEIS NO INTERIOR DO EDIFÍCIO

     Devemos alertar à situação de risco que talvez possa ter culminado na combustão do prédio; utilizaremos como parâmetro a IT 40/2018 do Copo de Bombeiros de São Paulo, uma vez que as normas técnicas dos Bombeiros do Rio de Janeiro não são claras. Esta norma estabelece parâmetros quanto ao uso de inflamáveis e combustíveis. Veja na imagem o que se diz na norma no item 6.


(Foto: IT 40/2018 - CBMSP)


    Esta Instrução Técnica ceda o armazenamento de inflamáveis e combustíveis no interior do edifício e quanto ao uso desses combustíveis em operações de restauros, devem ser armazenados em pequenos recipientes e guardados em armários metálicos, dentro de salas compartimentadas, ou seja, salas protegidas com paredes e portas anti-chamas.

PRESSÃO NÃO SUFICIENTE NOS HIDRANTES


   Entre todos os assuntos tratados, este sim resultou na difícil atuação dos bombeiros contra as chamas. Muitas vezes os hidrantes são esquecidos e apenas lembrados no pior momento, como foi o caso desde incidente; ao chegarem no local, a equipe de emergência constatou que não havia pressão suficiente nos hidrantes, erro que pode ter sido causado pelo mal dimensionamento da linha, sucateamento da mesma e/ou problemas técnicos da equipe. Contudo, por esse ocorrido, perderam-se 30min de ação, que ajudou na propagação das chamas e que deixaram a formação da brigada de mãos atadas.
Levando em consideração que o Museu Nacional tem 13.616,79m², área que consta no site oficial do local e também, utilizando as Instruções Técnicas de São Paulo (as mais creditadas do país):

  • IT 14/2018 - Carga de incêndio nas edificações e áreas de risco.

   Trata sobre a classificação das instalações, ela nos define dois itens importantes, a carga de incêndio e a quantidade de MJ/m², índices necessários para o dimensionamento dos hidrantes.


Divisão: F-8 / Carga de Incêndio: (qfi) de 300 MJ/m²


(Foto: IT 14/2018 - CBMSP)


  • IT 22/2018 - Sistemas de hidrantes e de mangotinhos para combate a incêndio.


    Já esta norma tratará dos requisitos mínimos para o atendimento de vazão e pressão mínimas através do Tipo de Hidrante.


(Foto: IT 14/2018 - CBMSP)



     Nesta tabela enquadramos a classificação da Instalação F-8 com a área quadrada do edifício e localizamos que o Hidrante deve ser de Tipo 2 com Reserva Técnica de Incêndio (RTI) de 25m³ (25 mil litros de água destinada para incêndio).


(Foto: IT 14/2018 - CBMSP)


    Já nesta outra tabela conseguimos perceber que a norma exige uma vazão mínima no hidrante mais longínquo da bomba/queda d’água de 150 litros por minuto numa pressão de 30 metros de coluna d’água.

    Através de todos estes pareceres, podemos concluir que o incêndio ocorrido no Museu Nacional ocorreu através de uma sucessão de erros seguidos pelos mais diversos escalões que fazem a gestão do mesmo. Faltaram responsabilidade e senso de patriotismo em permanecer com aquele prédio em funcionamento e atendimento ao público com as péssimas condições de uso que se encontrava. Os problemas eram dos mais diversos, desde fios desencapados, sucateamento dos hidrantes, o descaso governamental e principalmente a má gestão.

    Quantos Museus e Patrimônios Históricos brasileiros também não estão nessa mesma condição de descaso? Quantos mais acervos riquíssimos vamos ter que perder para nos conscientizarmos sobre a saúde dos nossos edifícios e nos livrarmos de uma vez por todas do alzheimer  histórico nacional, que nos faz esquecer de cuidar e amar a biografia do Brasil.

     Nós da ECOPetrus, nos colocamos a disposição para ajudar a fazer deste país um lugar seguro.




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Projetista Civil, Consultor Técnico em Segurança do Trabalho e Bombeiro Civil